vendredi 16 décembre 2011

O medo é a ferramenta que controla


Por que a humanidade concebeu a religião?
Michael Largo: A morte é uma das principais razões para a humanidade ter inventado a religião. As vidas dos nossos primeiros ancestrais foram atormentadas pelas incríveis incertezas. A morte foi a mais atormentadora. Naquela época, a expectativa de vida era de apenas 18 anos de idade, então a mortalidade era uma experiência cotidiana. Eu imagino um bando de humanos primitivos de pé ao lado do corpo de um familiar morto, se perguntando: “Para onde foi aquela coisa que dava vida e animação ao meu companheiro?”. Quando não havia mais respostas para a vida e para a sobrevivência, os humanos precisaram inventar explicações, que invariavelmente se tornaram catalisadoras para a teologia e a religião.


Quais foram os primeiros vestígios de religiosidade na história humana?
Largo: Os Neandertais provavelmente ensinaram aos humanos como praticar rituais religiosos e como buscar respostas ao inexplicável. Eles colocavam, por exemplo, crânio de urso e adereços ritualísticos em volta dos cadáveres. Os primeiros túmulos humanos, datados de 100 mil anos atrás, foram descobertos em uma caverna perto de Nazaré, em Israel. Os restos mortais tinham sido sepultados ritualisticamente, com os ossos pintados de vermelho, conchas marinhas dispostas ao redor e crânios apontando o Norte. Isso indica que nossos mais remotos ancestrais tinham uma crença, pelo menos, na vida após a morte.


Como começou essa sua vontade de conhecer diferentes religiões? O que você buscava?
Largo: Existem muitas religiões que vêm e vão e algumas milhares que são praticadas até hoje. Eu queria ver se havia uma verdade ou algum tipo de consistência entre a variedade de sistemas de crença. Para meus outros livros, eu pesquisei sobre a morte por muitos anos. Eu admito que, em alguns momentos, enquanto eu compilava estatísticas e contava as infinitas colunas de vidas humanas que vinham e iam – geralmente não deixando nenhuma marca de sua existência além de um mero dígito no cálculo –, eu me perguntava: “Qual é o propósito de tudo isso?”.

E você encontrou essa verdade?
Largo: Eu descobri que as religiões baseiam todos os seus fundamentos em ideias e conceitos que não podem ser provados e, por isso, nada pode ser oferecido como a verdade. Os mais loucos conceitos se tornaram dogmas, demandando fé para aceitá-los. Olhando pelo lado negativo, há uma tendência entre as religiões de promover o comportamento delirante e irracional. Na verdade, crenças religiosas têm causado mortes em massa, seja por guerras ou por dogmas e doutrinas. Mas olhando positivamente, de acordo com teólogos, as religiões têm confortado muitas pessoas e salvado bilhões de almas.

Você passou 25 anos de sua vida conhecendo religiões. Como se deu essa jornada, na prática?
Largo: Eu fui educado por jesuítas, mas minha experiência de campo começou como um coroinha católico que falava Latim. Pratiquei uma série de doutrinas orientais, do Zen à Meditação Transcendental. Nos anos 1970, presenciei uma cerimônia rastafariana na Jamaica. Também assisti a palestras da Nova Era, inclusive sobre teorias de anjos viajantes no tempo e a respeito do valor esotérico dos cristais. Comi cogumelos com algumas mulheres adeptas das religiões Druidas e Gaia, em Nova Iork. Cerimônias de anglicanos, metodistas, calvinistas – já assisti muitas. Dei a palma da minha mão para que a lessem, participei de uma sessão de regressão a vidas passadas, fui a retiros espirituais cristãos e orientais em fins de semana. Sem contar com os templos sagrados em Roma que visitei e o culto de santeria em Miami que participei. Reconhecidamente, e em nome da ciência, eu tomei alucinógenos, tentando infrutiferamente tomar notas sobre os diversos conhecimentos religiosos.

E em que países isso aconteceu?
Largo: Como existe mais de 300 mil locais de culto nos Estados Unidos, o meu país tem sido um terreno furtivo para a pesquisa. Mas eu gosto particularmente do Caribe. Estive também no México, na França, na Inglaterra, apesar de que a Itália, para mim, é o local mais cheio de santuários intrigantes.

Qual foi a situação mais exótica e bizarra por que você já passou?
Largo: Testemunhar sacrifício de animais foi tão bizarro quanto revoltante. Mas eu diria que um breve caso amoroso com uma freira dominicana, que eu conheci durante entrevistas na República Dominicana, foi a mais exótica – poderia chamar também de experiência erótica religiosa.

Qual sua dica aos curiosos religiosos?
Largo: Eu recomendo que eles confiram os detalhes de cada religião, antes de comprar a ideia. Façam isso lendo os dogmas de cada crença, da mesma forma que você leria o relatório de um produto. Muitas pessoas fazem uma pesquisa mais minuciosa sobre o celular novo que vão comprar do que sobre a religião que eles herdaram da família ou a que aderiram no decorrer da vida. Os cultos, que são definidos como grupos religiosos que demandam lealdade a um líder, são os mais arriscados. Muitos são especialistas em explorar o carisma, que pode facilmente cegar alguém da realidade e torná-lo um fanático.

Se você pudesse escolher apenas uma história de toda a sua jornada para contar, qual seria?
Largo: Depois de todas as igrejas que visitei e as entrevistas com pessoas religiosas que fiz, o momento mais comovente de como a religião funciona ocorreu no leito de morte da minha mãe. Ela sentia um grande desconforto e visualmente sofria de ansiedade e medo. Eu segurei sua mão e disse a ela uma mentira: que logo ela encontraria meu pai, pois ele estava esperando por sua noiva. Ela abriu os olhos só mais uma vez e sorriu, antes de falecer.

Como foi o processo de escrita do livro?
Largo: Eu já tinha muitos anos de anotações das minhas pesquisas de campo, mas passei um ano comprometido com a rotina devota. Trabalhei sobre textos antigos, li doutrinas e dogmas das religiões, fiquei atento ao que alguns monges chamam de lectio divina, ou leitura divina. Eu tentei não abordar nenhuma ideologia religiosa com condenações pré-condicionadas ou preconceitos.

Mas você consultou muitas fontes, além das experiências práticas?
Largo: Eu precisei ler o Velho e o Novo Testamento inteiros, além do Corão, é claro. No livro, eu listo uma centena de textos religiosos que usei como fonte.

O uso de chás, cogumelos e substâncias psicotrópicas faz parte de muitas crenças. Por que essas religiões aderiram a essas substâncias?
Largo: O escritor Aldous Huxley, durante seu experimento com substâncias psicotrópicas, notou que elas abriam as chamadas portas de percepção. Muitas religiões dão grande valor aos sonhos, como se fosse uma maneira de conhecer a voz de Deus. Mesmo no Império Romano, praticava-se o que se chamava de mistérios de Elêusis, que recomendava ingerir cogumelos pelo menos uma vez ao ano, a fim de ver e experimentar o que apenas Deus sabia. No entanto, tal atividade pode ser prejudicial à saúde.

Por que a religiosidade, em algumas pessoas, se torna insanidade?
Largo: Além do medo da morte, existe o medo da condenação eterna. Religiões que dão muito valor à vida após a morte e ameaçam quem não segue suas regras com a perspectiva de punição eterna geralmente levam seus fiéis ao fanatismo. Substâncias alucinógenas, rituais de jejum, automortificação e outros meios bizarros que as pessoas utilizam para atingir o êxtase religioso também costumam alterar a química do corpo, levando a um desequilíbrio mental.

No livro, você falou sobre “nudismo religioso”. Como funciona essa crença? Ela ainda existe hoje em dia em algum lugar do mundo?
Largo: Ela decorre de uma interpretação do Livro de Gênesis. O pecado foi o que levou à prática de vestir roupas e ao matrimônio. Adão e Eva, quando possuíam a inocência pura, não precisavam nem de vestimenta nem de casamento. A nudez, segundo a religião, é uma prova de que eles atingiram o estado de graça e estão libertos de todas as restrições morais concebidas pela humanidade. Hoje, existe a Igreja Batista do Calvário Nudista, no Texas.


Por que a ideia de apocalipse está tão incrustada nas diversas religiões? Por que os religiosos se apegam a ele?
Largo: Na minha pesquisa, eu descobri que mais de 80% dos cultos usam revelações de Agamemnon para arrebanhar seguidores. Novamente, o medo é a ferramenta que controla seguidores, especialmente quando envoltos na conversa de ter visões divinas.

Você acha que a religiosidade está ganhando cada vez mais força entre os humanos? Ou você acha que a humanidade caminha para a não religião?
Largo: Na estatística, menos pessoas estão indo à igreja, enquanto muitos continuam querendo aderir a uma ou outra religião. O ateísmo está em ascensão em todo o mundo, e saindo do armário. Como a tecnologia e a informação estão cada vez mais disponíveis, novos deuses estão sendo concebidos. O terrorismo mundial também ajudou a abrir muitos olhos, para ver em primeira mão o que fanáticos religiosos podem fazer. Eventos atuais indicam que nosso próprio fim dos dias, ou pelo menos uma transformação significante de nossa cultura, possa ser instigado por alguma forma de insanidade religiosa.

Você conheceu e pesquisou diversas religiões. Mas no que você acredita de verdade?
Largo: Eu acredito nas possibilidades do inimaginável. Como Stephen Hawking já notou, nós vemos o mundo a partir de uma perspectiva distorcida. Ele usa a analogia de um peixe em uma tigela redonda, observando todas as coisas se movendo em uma curva, devido à refração da luz através da água. Essa é a verdade para o peixinho. Seria necessária certa arrogância para pensar que nós realmente sabemos alguma coisa, não importa quantos livros nós tenhamos lido ou a graduação que possuímos.


Em sua opinião, para onde vamos quando morremos?
Largo: Talvez, nossos átomos são colocados em um liquidificador cósmico, e nós vivemos como parte de qualquer outra coisa. Eu não tenho a mínima ideia. Quem tem? Certamente será uma viagem inacreditável, mas uma viagem que eu prefiro evitar pelo tempo mais longo possível. [Risos].

O que você ainda não descobriu que quer descobrir?
Largo: Se existe um Deus. Acho que, se ele (ou ela) existisse, deveria ser capaz de vir até aqui e arrumar todas essas muitas ideias religiosas de uma vez por todas. Ou mandar um texto para o mundo inteiro, ou algo do tipo. Mas até nisso muitos não acreditam.

Sua próxima pesquisa será sobre o quê?
Largo: Estou terminando um texto sobre bestas e criaturas, reais e imaginárias, descrevendo como eles viveram e morreram.

Seguidores da Igreja Batista Nudista do Calvário, no Texas, EUA, acreditam que a salvação está em viver como Adão e Eva antes da expulsão do Jardim do Éden. Por isso, aboliram de suas crenças o casamento e defendem o nudismo sagrado, como prova da ausência de pecado. Esta é apenas uma das histórias peculiares relatadas por Michael Largo no livro “Lunáticos por Deus”, lançado no Brasil pela editora Lafonte.

O escritor, autor de meia dúzia de livros sobre a morte, nasceu em Nova York nos anos 1950, em uma família de jesuítas. Há 25 anos, porém, adotou como missão de vida documentar e coletar histórias de fanáticos religiosos. Nessa busca, Largo já presenciou sacrifício de animais, ingeriu cogumelos e outras substâncias psicotrópicas, ouviu tambores vodus no Haiti, assistiu a uma cerimônia rastafariana na Jamaica e leu mais de uma centena de textos religiosos.

http://revistagalileu.globo.com/Revista/Common/0,,EMI281112-17771,00-O+CACADOR+DE+RELIGIOES.html



vendredi 9 décembre 2011

Como lidar com as manipulações?

A economia comportamental parte do princípio que somos irracionais em alguns momentos. Como é isso?
Por 20 anos esse tipo de abordagem foi completamente rejeitada pelos economistas mainstream. Para eles, as pessoas eram racionais em todas as situações e entendem as situações bem o bastante para identificar os melhores caminhos.

A pesquisa psicológica, no entanto, diz que as pessoas têm muitas habilidades, mas que há muito no mundo para que consigam entender tudo. E que muitas situações que enfrentamos são tão novas que realmente não sabemos o que queremos. Assim, algumas vezes nós fazemos escolhas ruins. Marqueteiros levam vantagem desses erros, conseguindo manipular as nossa percepções e os nossos desejos.

Quando as pessoas não sabem exatamente o que querem ao tomar uma decisão, elas pegam dicas das circunstâncias e podem ser manipuladas. Um exemplo, em vários países, é sobre a questão de doar órgãos. Em lugares que você tem de formalizar uma opção para se tornar um doador, o número de doadores cai, e a situação contrária acontece quando você tem de formalizar a opção de não ser. Isso é explicado por uma tendência irracional a se adequar ao padrão ao fazer uma decisão. Se a pessoa entende que o padrão é ser doador, ele tem mais chances de decidir que também será.

Como lidar com as manipulações?
A melhor solução quando se vai tomar uma decisão é tentar ver várias perspectivas do problema. Por isso, é importante para o governo ter certeza de que a informação é apresentada de uma maneira justa. Nos últimos 4 anos, coordeno um comitê da FDA (agência americana que controla medicamentos e alimentos) para que as pessoas sejam informadas de uma maneira justa sobre remédios. Tudo que tem um benefício também oferece um risco. Diferentes formas de passar a mesma informação podem induzir as pessoas em direção a uma ou a outra das opções.

Mas os economistas comportamentais não querem apenas informar mais.
Enquanto nós psicólogos, neste campo, tentamos assegurar que a comunicação funcione bem, dar a melhor informação, os economistas comportamentais tentam fazer sentenças para empurrar as pessoas da decisão correta. Eles aproveitam os mecanismos de decisão irracional para manipular as pessoas em direção a algo que achem correto, como decidir mais por comprar frutas em vez de alimentos não-saudáveis.

O senhor concorda com esse empurrãozinho?
A questão que eu faria é: nós não estamos desistindo das pessoas muito rápido? Se nós tentássemos mais, não poderíamos fazer com que as pessoas tomassem as decisões certas, de maneira independente? Temos uma obrigação ética de trazer toda a educação que é possível, mas também precisamos ser realistas sobre os limites dessa educação. Se não há informação suficiente, temos de aumentar a educação. Mas, quando as decisões forem difíceis para as pessoas, elas precisam ser assistidas.

Não seria mais o caso das pessoas pararem mais para pensar sobre suas opções?
Pensar mais é bom, mas o que importa mais é ter diferentes perspectivas. Há muitos anos, fiz um estudo com outros psicólogos onde perguntamos às pessoas o quanto elas sabiam sobre coisas diferentes. Constatamos que, em geral, as pessoas são superconfiantes. Na média, achavam que acertariam mais questões do que realmente acertavam.

Demos então a um outro grupo a tarefa de pensar em uma série de razões pelas quais sua resposta inicial poderia estar certa e a um outro grupo pedimos que pensassem em como poderiam estar errados. O grupo que pensou sobre as razões para ter errado se tornou menos superconfiante e mais preciso sobre as previsões que faziam. O simples fato de você mudar a perspectiva e pensar nas razões pelas quais poderia estar errado sobre um fato faz com que suas estimativas se tornem mais realistas e que você seja menos sujeito a tendências irracionais.

Vivemos numa época de muita informação. Isso também nos leva a tomar decisões irracionais?
Há uma limite em relação à quantidade de coisas que você pode pensar, então isso pode sim fazer você cometer erros. Há 2 formas de lidar com isso. A primeira é restringir as opções. Pegue apenas um número pequeno de opções e você decidirá melhor sobre isso. A segunda é tentar pegar uma amostra de todas as opções possíveis.

Então, se você restringe a decisão de uma viagem a apenas custos, tempo e comida, é mais fácil que você acabe não errando. Mas isso te deixa vulnerável a perder coisas inteiramente. A outra estratégia é estar aberto a todas as possibilidades, mas assumir que você vai parar quando encontrar algo bom o suficiente. Se você parar para analisar cada detalhe de tudo, não vai conseguir, vai ficar louco e não vai fazer uma boa decisão.

Um dos meus colegas, Herbert Simon, Nobel de Economia, um dos fundadores da área, fez essa distinção: ou você faz um trabalho perfeito numa pequena porção de coisas, ou um trabalho satisfatório olhando para tudo.

As emoções também podem alterar nossas decisões?
Tem muita pesquisa recente mostrando isso. Em situações onde as pessoas não tem certeza, você pode mudar a decisão delas manipulando as suas emoções. Por exemplo, em situações de raiva, as pessoas tendem a ser mais otimistas. Se você está com raiva e te pedem que faça uma previsão sobre se algo vai funcionar, você tem mais chance que alguém que não esteja com raiva de achar que as coisas vão dar certo.

Baruch Fischhoff - PHD

http://revistagalileu.globo.com/Revista/Common/0,,EMI279849-17770,00-O+MARKETING+MANIPULA+NOSSA+PERCEPCAO+E+NOSSO+DESEJO.html