O cosmo que conhecemos reflete quem somos.
Quando o astrônomo americano Edwin Hubble descobriu, em 1929, que o
Universo está em expansão, nem ele mesmo quis acreditar. Mas os dados
não mentem. O que Hubble viu com seu telescópio de 100 polegadas era
inegável: a luz vinda de galáxias distantes aparecia alongada, indicando
que suas fontes se afastavam da Terra, o mesmo efeito que ocorre quando
uma sirene se distancia e ouvimos um tom mais grave. Na década de 1950,
baseado nessa proposição, o físico russo-americano George Gamow supôs
que a matéria que compõe as estrelas, as galáxias e as pessoas deve ter
passado por estados de altíssima compressão durante a infância do
Universo. Como matéria comprimida esquenta de maneira similar a pessoas
dentro do metrô lotado,
Gamow propôs que, no início do Universo, a
temperatura era tão alta que as ligações entre as partículas formadoras
dos átomos e seus núcleos se quebraram. O cosmo seria composto de uma
sopa primordial de partículas livres, colidindo furiosamente entre si.
Gamow e seus colaboradores Robert Herman e Ralph Alpher calcularam que,
se suas idéias estivessem corretas, o Universo estaria repleto de
radiação de micro-ondas, um fóssil da época em que os primeiros átomos
foram formados, 400 mil anos após a grande expansão que teria dado
origem ao Universo – o big bang. Quando essa radiação foi descoberta, em
1965, a cosmologia deixou de ser especulação e virou ciência.
Onde estamos hoje nessa história? Existem ainda muitos pontos
nebulosos. A composição do Universo permanece um mistério. Sabemos que
são três os ingredientes principais. O primeiro é a matéria comum,
daquilo que nós e as estrelas somos feitos. Ela é formada por átomos e
corresponde a apenas 4% do Universo. O segundo elemento é a matéria
escura: uma matéria exótica que circunda as galáxias como se fosse um
véu e que, provavelmente, é composta de partículas subatômicas. Ela
constitui 23% do Universo. O terceiro elemento é a energia escura: uma
forma de energia que permeia o cosmo e cuja natureza permanece
desconhecida. Ela representa 73% do Universo. Se somarmos a matéria
escura e a energia escura, percebemos que não conhecemos 96% da
composição do Universo. Por isso, a elucidação desse mistério terá
profundas implicações para nossa compreensão sobre ele. Alguns especulam
até que tanto a matéria escura quanto a energia escura mostrarão que a
descrição atual da gravidade, baseada na teoria da relatividade de
Einstein, precisa ser revisada.
E o momento inicial, o momento da “Criação”? Será que a física pode chegar lá? Gamow, muito esperto, evitou tocar no assunto, começando sua descrição do cosmo num momento em que a matéria já existia na forma de partículas elementares (pelo menos, elementares nos anos 1950). Hoje sabemos que o cosmo de Gamow tinha em torno de um centésimo de segundo de vida. A grande questão é o que ocorreu nesse primeiro centésimo de segundo. Sabemos como chegar bem mais perto do “zero”, até um trilionésimo de segundo após o big bang. Aplicando conceitos da física quântica – a física dos átomos – ao cosmo bebê, podemos até construir modelos que mostram como o Universo inteiro pode ter surgido de uma flutuação do espaço com energia zero. Se essas especulações fazem ou não sentido, é algo que ainda não sabemos. Porém, dessa discussão de origens cósmicas, fica claro que o que conhecemos do cosmo depende das perguntas que fazemos e dos instrumentos que usamos para respondê-las. O cosmo que conhecemos reflete quem somos.
E o momento inicial, o momento da “Criação”? Será que a física pode chegar lá? Gamow, muito esperto, evitou tocar no assunto, começando sua descrição do cosmo num momento em que a matéria já existia na forma de partículas elementares (pelo menos, elementares nos anos 1950). Hoje sabemos que o cosmo de Gamow tinha em torno de um centésimo de segundo de vida. A grande questão é o que ocorreu nesse primeiro centésimo de segundo. Sabemos como chegar bem mais perto do “zero”, até um trilionésimo de segundo após o big bang. Aplicando conceitos da física quântica – a física dos átomos – ao cosmo bebê, podemos até construir modelos que mostram como o Universo inteiro pode ter surgido de uma flutuação do espaço com energia zero. Se essas especulações fazem ou não sentido, é algo que ainda não sabemos. Porém, dessa discussão de origens cósmicas, fica claro que o que conhecemos do cosmo depende das perguntas que fazemos e dos instrumentos que usamos para respondê-las. O cosmo que conhecemos reflete quem somos.
Marcelo Gleiser
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